Entrevista com Andreia Rauber: sobre carreira, linguística e tecnologia da fala

Escrito por Carina Fragozo
A entrevista do mês de junho é com uma pessoa pela qual tenho profunda admiração: Andreia Rauber. Conheci a Andreia quando soube da oportunidade para trabalhar como linguista na Google, no ano passado, em um projeto gerenciado por ela. Durante meu período na empresa, ela se mostrou não apenas uma grande líder, mas uma pessoa extraordinária, sempre disposta a compartilhar seu conhecimento. Apesar da pouca idade, a Andreia tem um currículo de tirar o fôlego. Iniciou a carreira como professora de inglês, ocupou o cargo de Professor Adjunto na UCPel de 2010 a 2013 e foi professora/pesquisadora na Universidade do Minho, em Portugal, de 2008 a 2010. Já prestou serviços linguísticos para empresas como Amazon, BlackBerry, Microsoft e Sony/Gracenote e, agora, é gerente do projeto linguístico da Google Brasil.
Poucas pessoas possuem conhecimentos na área de tecnologia da fala no Brasil e a Andreia, sem dúvida, é referência no país e no exterior. Confiram a inspiradora entrevista.
EiB: Por que você decidiu estudar línguas e Linguística?

A: Nasci no interior do Paraná e na década de 90 várias escolas de inglês iniciaram atividades naquela região. Porém, não havia muitas pessoas que falassem inglês por lá, por isso, os professores, que não eram muitos, vinham de outras cidades. Com o aumento no número de alunos, os donos de escolas selecionavam os melhores alunos para já começarem a lecionar também. Após três anos de curso, fui convidada, em 1992, aos 14 anos, a lecionar para a minha primeira turma de adultos. No ano seguinte, fiquei responsável por mais e mais turmas e após três anos já atendia escolas de outras cidades. Ou seja, o meu interesse por idiomas sempre existiu, mas a questão de me tornar professora de inglês e aprofundar os meus conhecimentos linguísticos foi pelo momento e local onde morava. Na época, sonhava em ser uma secretária executiva, por isso fiz o curso de Graduação em Secretariado Executivo. Mas, ironicamente, não havia grandes oportunidades para secretárias, enquanto trabalho como professora de inglês havia de sobra. Então, decidi fazer o mestrado e doutorado em Letras Inglês na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) de 2001 a 2006 e lá me apaixonei por fonética já na primeira aula que tive com a super Professora Doutora Barbara Baptista.

EiB: Conte-nos sobre sua experiência como professora/pesquisadora no Brasil e no exterior.

A: Trabalhei como professora em uma escola de idiomas (CCAA) durante oito anos, então estudei seis anos na UFSC e lá me tornei pesquisadora. Durante o doutorado, estudei na Universidade de Amsterdam por cinco meses e essa experiência mudou a minha vida, pois trabalhei ao lado de excelentes pesquisadores que respiravam fonética o tempo todo. Foi um crescimento rápido em pouco tempo. Assim que concluí o doutorado, em 2006, fui convidada a trabalhar no Departamento de Engenharia Elétrica da UFSC e foi lá que aprendi o básico sobre tecnologia da fala, mais especificamente sobre como fazer conversores texto-voz. Essa experiência foi importante para conseguir o meu emprego seguinte, em 2007, na filial belga de uma empresa americana (Nuance), que é líder mundial em tecnologia da fala. Lá fui responsável pela parte linguística para desenvolvermos uma voz para o português europeu, a Joana, facilmente acessada em vários aparelhos de GPS ou gratuitamente em conversores de voz disponíveis na internet, como Oddcast. A experiência na Bélgica foi tão positiva que tive vontade de permanecer na Europa e, por isso, inscrevi-me em um concurso para pesquisador em uma universidade portuguesa (Universidade do Minho). Passei no concurso e de 2008 a 2010 trabalhei na cidade de Braga, tanto no departamento de linguística, como auxiliando colegas psicólogos em projetos de psicolinguística e neurociência que envolviam dados da fala. Em Portugal também lecionei algumas disciplinas de linguística aplicada, fonética acústica e estatística, mas o foco era a pesquisa em aquisição da pronúncia de língua estrangeira. Em 2009, recebi um convite para trabalhar como consultora linguística em projetos de tecnologia de fala, novamente para a Nuance, mas desta vez o trabalho deveria ser executado remotamente e a carga horária era leve. Como era um trabalho terceirizado, estava oficialmente vinculada à Appen Butler HIll, que acabou abrindo portas para trabalhos linguísticos em outras grandes empresas, como Amazon, BlackBerry, Google, Microsoft e Sony/Gracenote. Assim, estava conseguindo unir duas grandes paixões: a pesquisa e o trabalho de consultoria linguística para projetos de tecnologia de fala. Porém… as saudades do Brasil e a vontade de não mais me sentir uma estrangeira aumentavam e, no Natal de 2009, recebi um convite irrecusável para trabalhar no Programa de Pós-Graduação da Universidade Católica de Pelotas (UCPEL). Foi outra experiência intensa e gratificante. Trabalhei na UCPEL de 2010 a 2012 como professora e pesquisadora na área de linguística aplicada/linguística. As disciplinas que mais gostava de ministrar eram Fonética Acústica e Estatística, mas felizmente pude seguir lecionando inglês para os alunos de graduação. Devido ao trabalho na UCPEL, tive a oportunidade de trabalhar na Dinamarca como pesquisadora e professora de fonética do português durante três meses. Ainda na UCPEL, orientei vários trabalhos de graduação, dissertações de mestrado e teses de doutorado e segui com os trabalhos de consultora na Appen. No entanto, trabalhar em
um programa de pós-graduação já significa serviço mais do que suficiente e, com o excesso de trabalho, veio o momento de tomar uma decisão difícil: continuar professora/pesquisadora ou trabalhar apenas como consultora linguística? Optei pela segunda paixão e pedi demissão da UCPEL. Alguns meses após o pedido de demissão, candidatei-me para a vaga de gerente de projetos linguísticos no Google e fui selecionada.

EiB: Fale sobre seu trabalho como gerente de projeto linguístico no Google e em outras empresas. O que faz um “Speech Data Project Manager”?

A: De forma resumida, na área de tecnologia de fala, um “Speech Data Project Manager” é responsável por criar/aperfeiçoar regras linguísticas e redigir/adaptar manuais linguísticos para uma determinada língua; treinar linguistas, distribuir tarefas e constantemente avaliar a qualidade do trabalho dos linguistas. Os trabalhos variam muito de empresa para empresa, mas geralmente envolvem transcrição grafêmica e fonética de dados da fala, classificação de palavras de acordo com categorias estabelecidas por cada empresa, suporte linguístico a engenheiros para que desenvolvam produtos relacionados a reconhecimento de voz e transformação de texto em voz.

EiB: Como você avalia o papel do profissional de Linguística no Brasil atualmente?

A: Acredito que a importância do linguista tem crescido bastante no Brasil. Os linguistas têm sido cada vez mais procurados para interagir com outras áreas, como no meu caso fonoaudiologia, neurociência, psicolinguística e engenharias. É importantíssimo o linguista estar aberto a essa interação com outras áreas, pois todos crescem. Por exemplo: um neurocientista não tem a menor ideia de como manipular arquivos de som para os seus experimentos, e um linguista não costuma ter conhecimento profundo sobre ondas cerebrais. Então, a união de conhecimentos resulta em pesquisas com procedimentos metodológicos de qualidade que resultam em pesquisas muito úteis à comunidade não só acadêmica. Em um dos estudos que ajudei com conhecimentos de fonética acústica, encontramos dados relevantes para auxiliar pessoas com Esquizofrenia e Síndrome de Williams a detectar a doença através de um teste de percepção de prosódia. Percebo que, muitas vezes, por insegurança ou até falta de tempo, os linguistas se limitam aos seus mundos e ignoram ou não interagem com outras áreas. Muitas categorias profissionais precisam de nós, por isso, não tenhamos medo de colaborar com pesquisas variadas. Lecionar é importante, mas até o lecionar fica mais rico se pudermos ler e aprender sobre diversos assuntos.

EiB: Muito obrigada pela participação, foi uma honra poder te entrevistar. Parabéns pela belíssima carreira!


A: Foi um prazer responder as suas perguntas e espero que as respostas motivem outros linguistas a ousar mais e a perceber que há um mundo muito maior que o departamento de linguística de cada instituição. 🙂

Colegas da Universidade de Amsterdam e o Prof. Paul Boersma (2005)

Andreia em sua defesa de doutorado (2006)

 
 Em seu escritório na Nuance, em Merelbeke, Bélgica (2007)
Em Braga com os colegas da Universidade do Minho Annie (neurociência) e José (física) (2009)

Sala silenciosa para coleta de dados para o estudo sobre a produção e a percepção de sons do português e do inglês por chineses (2010)
Turma de Estatística da Escola de Verão do PPG em Letras da UCPEL (2012)

Despedida de suas atividades da graduação – Turma de Inglês UCPEL (2012)

Andreia e a equipe de especialistas em projetos linguísticos na Google Brasil:
Magnun Madruga, Fernanda Reis, Roberta Cury, Carina Fragozo e Armando Silveiro (2013)

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