O que o BBB tem a ver com Inglês?

Escrito por Carina Fragozo

É quase inevitável: se você mora no Brasil e tem acesso à internet, muito provavelmente receberá – direta ou indiretamente – vídeos, fotos e comentários sobre o Big Brother Brasil. Todo início de ano é a mesma coisa: sempre temos o debate entre quem ama e quem odeia o programa e uma porção de memes surge a partir de momentos marcantes do reality. Nós, aqui no English in Brazil, usaremos o BBB para falar de ciência. Isso mesmo! Linguística, a ciência que estuda a linguagem humana.

O sotaque de Caio e Rodolffo

Viralizou, dia desses, uma conversa entre Caio e Rodolffo, dois participantes do programa. O que chamou a atenção, muito mais do que o assunto da conversa, foi a forma como os brothers usaram a língua. Caio é de Anápolis-GO e Rodolffo é de Uruaçu-GO, e o sotaque goiano apareceu de maneira bastante evidente. Uma característica desse sotaque está na pronúncia do gerúndio (verbos que terminam em –ando, –endo e –indo, como “andando”, “comendo” e “dormindo”): os participantes pronunciam esses verbos sem o [d], formando –ano, –eno e –ino. Isso é bastante comum em alguns sotaques do Português Brasileiro, e não há problema algum nisso (só para deixar claro!). Veja o vídeo da conversa:

A Linguística explica!

Mas por que isso acontece? A Linguística explica! Antes de tudo, faça um teste: escolha qualquer palavra e a pronuncie lentamente. Perceba como a sua língua se movimenta, como os seus lábios trabalham e como a suas cordas vocais vibram (para perceber a vibração, coloque a mão sobre seu pescoço enquanto fala). Os sons da fala são produzidos de acordo com o lugar que a nossa língua está, a maneira como os nossos lábios se movem, a vibração (ou não) das nossas cordas vocais, entre outras coisas. Entretanto, nós temos muitos sons e às vezes produzimos mais de um som no mesmo lugar. Quer ver? Fale a palavra “nadar” e perceba os lugares onde /n/ e /d/ são produzidos. É quase no mesmo lugar, certo? Agora, mude um pouquinho: fale a palavra “nadando” e perceba a movimentação da sua língua ao falar “–ando”. 

Na maioria das nossas conversas, não estamos fazendo testes fonéticos, então a gente não pronuncia as palavras lentamente (seria bem estranho). Dessa forma, é possível que a rapidez da pronúncia faça com que o som do /n/ – que entra na palavra nasalizando a vogal – e o som da consoante /d/ se fundam em um só, transformando “nadando” em “nadano”. É a lei do menor esforço: é mais fácil apagar o /d/, já que a língua está exatamente na mesma posição do /n/.

O que isso tem a ver com o inglês?

Tá, beleza. Agora, você pode estar se perguntando: o que um texto sobre o gerúndio do Português Brasileiro está fazendo no blog English in Brazil. A resposta é simples: no inglês, essa assimilação de sons também é muito comum. Até temos outra consoante na jogada: o som /t/, que é produzido num lugar bem parecido que /n/ e /d/. Perceba ao pronunciar a sentença: “You and I could go to an Internet Café someday.” No inglês, uma frase como essa pode ser pronunciada na fala natural como “Iu enai culd gou tu an inernet café sãmdei”, justamente pela mesma assimilação que acontece no Português Brasileiro.

Contudo, assim como no Português Brasileiro essas características são mais comuns em sotaques como o goiano, no Inglês, também temos os sotaques que produzem esse tipo de fenômeno com mais frequência. No Inglês Americano essa característica é muito mais comum do que no Inglês Britânico, por exemplo. 

É importante esclarecer que essas são características que podem aparecer ou não em sotaques das duas línguas. Não estamos aqui assumindo postura de juízes que determinam o que é certo ou errado. Nosso papel, enquanto Linguistas, é olhar para a língua de um ponto de vista científico, descrevendo e analisando como as línguas funcionam. Imagine se um biólogo ignorasse a existência do sapo só porque boa parte da população acha ele feio. Não faria sentido, né? 

Para refletir:

Levando isso em conta, cabe-nos uma reflexão: muitas vezes, o brasileiro ridiculariza esse fenômeno no próprio idioma, mas faz de tudo para produzi-lo no inglês, acreditando que ficará mais próximo ao “falar nativo”. Por que será que isso acontece?

Post escrito por Vitor Hochsprung, mestrando em linguística pela UFSC. Se você se interessar por esse olhar científico sobre as línguas, aproveite para seguir o perfil dele no Instagram clicando aqui! Obrigada pela contribuição, Vitor! Continue esse trabalho lindo de divulgação da Linguística de forma leve e divertida!

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